quarta-feira, 6 de maio de 2009

monólogos de um ébrio meliante....


Desempregado e sofrendo da dor lancinante que nunca abandona os que mal amaram, o meliante ebrio uma vez mais se contorce no seu vazio sufocante de anonimato, numa sala vazia e iluminada apenas pelo fio de luz de um unico abajur. Clima piegas de um cenario suicida ao som de Roberto Carlos. Sobre a mesa de centro um cinzero repleto de bitucas amassadas numa furia bebada. Caida no tapete uma garrafa vazia de Jack Daniels.
Uma vez mais ele torna a ligar pra ex mulher. Inconformado pelo abandono a rastejar numa nostalgia atroz.
E novamente, como tem sido nas semanas que se arrastam, a voz robotica de gravação atende:

...você ligou para (numero do tel), no momento não posso atende-lo...por favor, se você não é o Marcelo, deixe um recado após o bip...

Oi...sou eu, Marcelo...
talvez você nem ouça o resto dessa mensagem. não vai se dar ao trabalho visto a arrogância cega que lhe corroi o espirito e lhe embota a mente. quiçá ja tenha desligado agora mesmo, nesse exato instante. conhecedora temerosa das verdades a seguir. ou antes ate, quando disse meu nome mesmo sabendo que você ja sabia quem era. sua vontade é não ouvir minha voz novamente.
compreensivel. desde a infancia sofro a tortura dessa voz estridente e perturbadora de gnomos androginos em contos de fada. as vezes me calo por não me aguentar. compartilho seus sentimentos. não muitos deles, é claro. como eu poderia, por exemplo, amar um cachorro fétido e minusculo que é a antitese do significado inveterado de um cão? que nunca sob hipotese alguma foi fiel a mim. sempre cedia ao caprichos da velha tricoteira. que mijava acintosamente na minha Folha de São Paulo todas as manhãs a mando cochichado dela.
disse tambem que não queria me ver, pois bem, não esta. a grande vantagem do aparelho telefônico é não olhar pra essa sua cara nojenta de burguesa mimada.
tentei num silencio resignado permanecer abstêmio. mas umas doses de whisky me inflamou o peito cheio este de uma angustia reprimida. tentei me calar. a raiva crescia. esforcei-me ao ponto em que se sustenta o nó. e ele arrebentou-se.
precisava desdizer algumas coisas. injusto que eu esteja sob acusações e não possa me defender.
sua mãe é uma caluniadora. fato. sempre dizendo de mim como se eu fosse alcoolatra. bebo esporadicamente uma vez por dia. eu não tenho o habito desagradavel de encher de fumaça a sala das pessoas contaminando assim os pulmões alheios. pior ainda o pigarreiro a cada minuto. tenho a certeza de se tratar de um cacoete. uma devoradora de nicotina e catarro.
ja pensou na sua mãe dessa forma?
eu não tive intenção de atropelar seu cachorro. eu queria mesmo era passar por cima daquele corpo enrugado e macilento que levanta na madrugada num arrastar de chinelos pela cozinha. que gargareja ali como um peru macho no cio.
fazer com que ela cuspisse a dentadura metros adiante. que fosse enterrada com a boca murcha de alcoviteira.
maldita fidelidade canina. dou o braço a torcer, como dizem por ai os analfabetos.
o filho da puta era um bom cachorro.

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